Existe futuro sem neuromarketing?
Fuçando o site do Ibramerc e a agenda do Fórum de Inteligência de Mercado, dei de cara com o termo neuromarketing. O que logo me veio à cabeça foram as aulas de biologia do ensino médio – das quais, honestamente, pouco me lembro – e o monte de palavras que julgava serem relacionadas a ‘neuro’: neurônio, neurologia, sistema nervoso. Neurose: tudo isso estava muito longe da minha realidade. Desci a barra de rolagem atrás de outro tema, que fosse mais próximo àquilo com que lido em meu dia a dia. Salesforce, CRM, precificação, agora sim... pera aí!
Subi a barra de rolagem. Mas é claro, neuromarketing! Tudo aquilo que a mim outrora soava como grego era, agora, inteligível. O clique veio quando me lembrei de uma pesquisa de que participei, dessas que fazemos quando precisamos de dinheiro, em que me mandaram sentar e simplesmente assistir à televisão por uma hora. ‘Grana fácil’, pensei à época. Agora que resgatei a memória, tudo faz sentido: encheram-me de eletrodos, e dois homens ficavam olhando para mim, todo o tempo, através de uma parede de vidro, e monitorando alguma coisa na tela de um computador. E mais: destros compunham um grupo, canhotos, outro. Havia de ter alguma coisa a ver com neuromarketing!
Você deve estar se perguntando como ainda me era alheia essa ciência, hoje tão difundida. Ela é realmente fascinante: como podem campos de estudo pouco afins (pense como ficam longe os departamentos de Comunicação e de Neurociência em uma universidade) conversarem entre si e trazerem resultados práticos? Mais uma comprovação de que não há limites para o conhecimento humano e suas aplicações.
O neuromarketing
Neurociência é uma disciplina que estuda o sistema nervoso, aquele que conecta todo o organismo do ser humano. Embora possa ser vista, a princípio, como uma ciência biológica, ela tem contribuído para avanços em diversas áreas de conhecimento. Uma das mais beneficiadas é o marketing, que encontrou nela uma forma poderosíssima de estudar a faceta do homem que interessa ao mercado: o consumidor.
Entendendo como ele age quando vai consumir, gasta-se melhor. O dinheiro é corretamente aplicado porque a comunicação feita pela empresa é baseada em dados científicos, que permitem antecipar como funcionam os desejos, impulsos e motivações dos clientes. O neuromarketing reduz a margem de erro das pesquisas de mercado tradicionais – claro, não existe precisão inequívoca, mas a destreza é bem maior.
O pulo do gato é uma descoberta que contraria uma suposição muito comum. O cérebro humano é formado por três divisões: o sistema reptiliano, que é responsável pela sobrevivência, por isso é associado a todos os instintos e reflexos necessários a sua garantia; o sistema límbico, responsável por ditar o comportamento emocional de cada indivíduo; e o sistema neocórtex, associado à racionalidade e que possibilita o pensamento lógico e a linguagem.
Agora responda: qual desses três sistemas é responsável pela tomada de decisão? Se você, assim como eu, escolheu neocórtex, partiu da suposição comum a que me referi no parágrafo anterior. O que ocorre, na verdade, é que entre 85 e 95% das nossas decisões são tomadas pelos sistemas reptiliano e límbico. Essa descoberta indica, portanto, que qualquer comunicação entre empresa e cliente deve ser direcionada a esses dois sistemas, já que são eles que vão orientar a decisão de compra.
Essa é apenas uma das várias contribuições proporcionadas pelo neuromarketing, mas é bastante sintomática da revolução que a ciência tem trazido para o mercado.
Marketing tradicional x neuromarketing
“O que as pessoas dizem, o que as pessoas fazem e o que as pessoas dizem que fazem são coisas inteiramente diferentes”. Esta frase – embora tenha sido cunhada, por Margaret Mead, eminente antropóloga norte-americana, muito antes do advento do neuromarketing – pode ser considerada argumento a ele favorável para comprovar a imprecisão dos métodos em que são – ou eram – baseadas as campanhas publicitárias tradicionais.
A lógica é a seguinte: se os dados de mercado que fundamentam qualquer estratégia de marketing são extraídos por meio de pesquisas, estão suscetíveis àquilo que Mead já enunciava décadas atrás. Em outras palavras, há chances de estarem distorcidos. É claro que representam, sim, diretrizes para as ações das empresas – não se pode simplesmente desconsiderar as metodologias tradicionais –, mas são, ainda, mais imprecisas.
E é essa a grande revolução proporcionada pelo neuromarketing: as análises computadorizadas da atividade cerebral não mentem, não omitem e não se distorcem (embora estejam, claro, sujeitas a uma leitura humana). Eu, você, um profissional de marketing, um neurocientista e qualquer pessoa somos constantemente enganados por nosso cérebro; é ele quem sabe o que queremos. Muitas vezes, os resultados apresentados por pesquisas de eletroencefalografia, por exemplo, são totalmente contraintuitivos.
Por isso, a melhor forma de mapear o perfil de compra dos consumidores é estudando seus cérebros, não aquilo que verbalizam. E não estamos, aqui, falando sobre algo que figura em um futuro distante. Inês Cozzo, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Neurobusiness, chama atenção para o fato de que “ainda que o neuromarketing possa ser chamado de tendência, por sua novidade e poucos profissionais que o dominam, já é uma realidade, tanto que instituições reconhecidas no mercado já oferecem cursos de pós-graduação em neuromarketing e em neurobusiness. Com chancelas como estas, com certeza, já podemos afirmar que o neuromarketing é uma realidade, com tendências a crescer cada vez mais”.
Há limites para o neuromarketing?
A tecnologia progride de forma exponencial. Todos sabemos disso, é algo latente: basta pensar em como era o mundo há vinte anos, há dez anos, há cinco anos e como é hoje... A curva que se desenha em nossa cabeça segue uma progressão geométrica. Sabemos, também, que os estudos em neuromarketing dependem em grande medida dessa tecnologia. Não cabe, aqui, descrevermos todas as ferramentas de pesquisa existentes, apenas lembrar que são intensivas em tecnologia.
Portanto, se ela se desenvolve rapidamente, é lógico supor que também assim se comportarão os estudos em neuromarketing e o mapeamento dos processos de decisão dos seres humanos. Se há nesse avanço um viés bastante positivo – a diferentes níveis –, há um questionável – a nível ético.
Hugues Godefroy, diretor comercial da Cepêra e membro do Conselho Deliberativo do Ibramerc, levanta a questão: “manipular o cérebro das pessoas para ganhar mais dinheiro tem limites? Não tem limites? É moral? É imoral? Já pensou, no campo do marketing político, os desvios possíveis ao usar o neuromarketing para fazer as pessoas votarem mais em determinado candidato?”.
De fato, essa é uma barreira na qual esbarram muitas das aplicações práticas da neurociência. É um debate extremamente complexo, que envolve questões filosóficas, mas sem dúvida pertinente. The Oxford Centre for Neuroethics, instituição de grande referência no assunto, ratifica a provocação de Hugues: “os avanços em imagens e manipulações do cérebro têm levantado desafios éticos, particularmente sobre os limites morais do uso de tal tecnologia”.
Se o neuromarketing é um tema recente, é de se imaginar que a discussão sobre os possíveis desvios éticos de suas aplicações seja mais recente ainda. E não há resposta definitiva para nenhum dos questionamentos suscitados – embora o debate a respeito do assunto seja intenso. O que se pode afirmar é que, até agora, o neuromarketing tem se desenvolvido aceleradamente, e qualquer barreira que eventualmente surja parece ser insuficiente para frear seu avanço.
Return on Investment em neuromarketing
Caso você seja mais pragmático e volte sua atenção preferencialmente aos ganhos práticos que as coisas têm a oferecer, provavelmente esse intertítulo lhe foi muito mais atrativo que o anterior, que discute questões filosóficas (poderíamos fazer um estudo de eyetracking para comprovar minha teoria :p).
É cabível questionar como calcular o retorno financeiro que se tem ao investir em pesquisas neurocientíficas para fins de marketing, dado que são, ainda, bastante caras. Em outras palavras: como se gasta muito dinheiro, é preciso monetizar os resultados. As conclusões oferecidas pelos especialistas que contribuíram para este artigo, todavia, não são animadoras para quem gostaria de ver uma equação exata.
Inês Cozzo afirma que “a precisão do neuromarketing vem da tangibilidade dos dados da análise neurocientífica. Em nenhum tipo de ação de marketing com qualquer ferramenta que se utilize é possível estabelecer uma previsibilidade de resultado, pois ele não está atrelado à qualidade da análise, mas a todas as variáveis mercadológicas, e que são imponderáveis”.
Hugues Godefroy complementa: “a questão do retorno financeiro, como dizia Ogilvy (publicitário britânico, conhecido como ‘o pai da propaganda’), passa pelo incremento de vendas registrado. Porém, estamos ainda numa fase preliminar de descobertas e aprendizados que precisariam virar insights para eventualmente ter ganhos acima dos mesmos”.
Ou seja, se a sua grande preocupação é saber exatamente quanto será o ROI de suas ações de neuromarketing, deu um tiro n’água – pelo menos por enquanto. Não obstante, por mais pragmático que você seja, pode apostar (o risco é baixo): grande parte do futuro do marketing passa por essa nova ferramenta. Isto é: vale o investimento!
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O que você acha do neuromarketing? Como você acha que ele vai transformar a relação entre marcas e consumidores? Deixe seu comentário abaixo!
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