A projeção de vendas possibilita o gerenciamento mais eficaz de uma empresa, economizando o excesso de estoque, aumentando lucros e servindo aos clientes com mais eficiência. Decisões táticas, operacionais e estratégicas têm - cada uma em seu bojo - ferramentas específicas para soluções apropriadas. Os desafios, porém, são muitos: falta de dados, excesso de suposições, choques aleatórios e contexto dinâmico influenciado por greves e outros eventos pontuais. A boa notícia é que há um remédio para cada problema.
Matemáticos e outros cientistas experimentalistas dedicaram suas vidas a explorar fenômenos da natureza e a criar modelos heurísticos que interpretam nossa a realidade. Os experimentos que permitiam repetibilidade a estes notáveis humanos abriram portas para descoberta de parâmetros e recorrências de manifestações relevantes à nossa interação com o universo. O logro acumulado destas descobertas nos permite hoje modelar com nossos próprios métodos de projeção quantitativa, ou seja, aplicar rigorosas técnicas estatísticas que se propõem a estimar nossas vendas com o objetivo de errar o mínimo possível, mas dobrando os modelos aos nossos desafios.
Acontece que o comportamento de variáveis relevantes aos negócios como vendas, faturamento, taxa de juros, demanda, etc, nem sempre é suficientemente estável e de mensuração viável. Por isso, lançamos mão da avaliação qualitativa, que coexiste na determinação dos níveis de cada uma dessas variáveis. Aspectos comportamentais que ciências humanas como geopolítica, psicologia, marketing e muitas outras se propõem a explicar. Para essas ciências humanas, a experimentação é muito mais difícil e exige critérios muitas vezes não pacificados na academia, condicionados às interpretações de escolas em debate constante e à luz da ebulição de novas descobertas.
Ferramentas Quantitativas para Projeção de Vendas
Por mais contrassenso que pareça, as ferramentas de projeção quantitativas são mais fáceis de serem aplicadas e testadas do que as do mundo qualitativo. Dentre as ferramentas de projeção quantitativa mais conhecida, um aspecto é unânime: utiliza-se do que ocorreu no passado para criar modelos e, assim, estimar o futuro.
Isso significa que assumimos que o resto das variáveis externas ao nosso modelinho (sim, heurístico e simplificador o suficiente para ser humildemente escrito no diminutivo) se mantém constante. Nós economistas, nos defendemos com o jargão latino ceteris paribus, que significa “todo o resto constante”. Ora, “então os modelos de projeção de vendas só funcionam em ambiente controlado?”, você deveria se perguntar. A resposta simples é: sim.
Conscientemente, protegemos nossos modelos matemáticos com premissas para tomarmos nossas decisões e, ainda assim, eles são passíveis de erro aleatório, aquele erro que o modelo não explica, mas assume que cometerá nas previsões. A proposta da modelagem na projeção de demanda jamais será acertar exatamente os valores previstos, mas sim errar o mínimo possível. Mostre isso aos acionistas e conselho da sua empresa na hora de definir metas de acurácia de previsão, essa fatídica realidade deve causar, no mínimo, um debate saudável sobre o que vocês vêm buscando.
É possível dividir as técnicas de modelagem de projeção de vendas em dois grandes grupos taxonômicos: Modelos Causais e Modelos de Séries Temporais. O primeiro grupo se propõe a ser mais dinâmico e incorpora variáveis exógenas escolhidas para explicar o movimento das vendas. A ideia básica consiste de escolher uma variável (ou várias, caso seja uma análise multivariada) e encontrar uma relação linear entre a variável objetivo (vendas) e a variável causal:
Através do cálculo diferencial adicionado a uma aplicação de sistema de equações, é possível descobrir qual é a relação linear entre, por exemplo, temperatura ambiente média registrada em diversas cidades de uma determinada região no dia de uma Festa Junina, e a Quantidade de Paçoca vendida em cada uma destas festas, como visto na Figura 1.
Imagine o benefício de testar todas as variáveis deste caso: PIB Municipal, PEA (População Economicamente Ativa), preço da paçoca, preço dos outros quitutes, etc. É possível, com dado intervalo de confiança e taxa de determinação (capacidade de explicar) do modelo, estimar as vendas e preparar toda cadeia de suprimentos das próximas festas em função disso, apenas imputando valores para as variáveis independentes X1 e X2, como exposto na Figura 2.
E se chover no dia da Festa Junina? O modelo também pode incluir variáveis como pluviosidade, greves, bloqueios, falta de combustível, todas exógenas ao negócio. O desafio maior é a caça pelo ajuste junto às variáveis que realmente tenham relação causal, além de suficientemente alta correlação linear. Não adianta descobrir que há correlação entre venda de paçoca e taxa de imóveis próprios x alugados no município, por exemplo. É necessária uma relação direta e causal para que a projeção seja aderente à dinâmica que envolve esse sistema. Uma vez encontrada a equação que descreve bem o fenômeno, basta lançar mão de simulações e começar um trabalho de monitoramento das variáveis estimadoras do modelo (e da realidade).
Os modelos de Séries Temporais já dão total ênfase ao passado, extrapolando uma previsão de futuro através de um ajuste aos valores registrados historicamente pela variável que se deseja prever. A modelagem pode ser complexa, envolvendo um polinômio com termos que tratem sazonalidade, tendência e outras funções que mimetizam a realidade, ou muito simples e acessível, como é o caso da Média Móvel.
A escolha do melhor modelo se dá pela busca do ajuste que apresenta menor erro quando cada resposta de modelagem é posta à prova dos valores expostos. É a aplicação prática da pergunta: “Se o modelo tivesse previsto o passado recente, ele teria errado quanto?”.
A resposta a esta pergunta define se o modelo é apropriado ou não. Ao compararmos vários modelos, e seus erros contra o “realizado”, podemos medir qual modelo apresentou maiores desvios (na média, ou percentualmente) tendo o nosso quaesitum a minimização deste erro. A Figura 3 abaixo mostra um gráfico que compara um realizado de Vendas (linha azul), com três modelos diferentes de Média Móvel, sendo um deles, o que tem menor distância média contra os dados realizados de venda na comparação Jan/14-Dez/17, utilizado para extrapolação futura (em verde, realizando projeção).
A sombra, após Jan/18 em torno do previsto para o modelo 2, é uma sugestão de intervalo de confiança, oriundo do estudo de desvio padrão da amostra testada e confirmada com distribuição normal.
Basicamente são estes dois grupos, Modelos de Relações Causais e Modelos de Séries Temporais, que são utilizados para modelagem de projeção de demanda. Há ainda outras formas quantitativas de projetar vendas menos difundidas.
Para alguns mercados de venda mais complexa, notadamente as consultivas (Imóveis, Consultorias, Vendas Técnicas, Projetos, Serviços sob medida, etc) o funil de vendas é fortemente recomendado para o curto e médio prazo.
Funil de Vendas
O funil de vendas é um conceito já bastante difundido para gestores de equipes comerciais que controlam o rendimento de seus times através da conversão fase a fase dos clientes no processo de atendimento. A jornada pela qual o consumidor passa pelo atendimento pode, e deve ser dividida em fases que vão aproximando o cliente do fechamento, diagnosticando necessidade, resolvendo empecilhos, conhecendo o produto/serviço e se encantando com o produto.
No mundo web, em que os clientes navegam pelos sites de e-commerce ou portais de anúncio, as taxas conversões de cada fase são passíveis de medição, onde todo internauta é exposto no processo de venda. Se o cliente entra em um site, ele já é, prima facie, chamado de Suspeito ou Suspect. Caso este suspeito declare interesse deixando um meio de contato, ele já é considerado um Contato, ou Lead.
No mercado imobiliário um cliente avança fase a fase no atendimento, e esse mesmo funil, com as fases análogas às ações do cliente, serve para gestão e projeção: visita, proposta, negociação, fechamento, etc. Serve para os gerentes saberem em que fase do atendimento os corretores de imóveis estão perdendo mais tempo ou deixando clientes escaparem.
Na figura 4, além do Funil de Vendas mostrar o número de clientes que foi atendido por cada fase em um mês, há uma coluna ao lado indicando a taxa final de conversão ou Hit Rate. Essa taxa mostra quantos clientes, de todos que chegaram a avançar até aquela fase no processo de atendimento, devem fechar negócio. Essa medição pode ser feita historicamente e alimentar um modelo de projeção final de vendas, com base no típico aproveitamento de uma equipe. Para calcular o Hit Rate, basta dividir o número de fechamentos em um determinado período pelo número de clientes totais que chegaram até a fase em questão.
Vale notar que cada fase terá o seu Hit Rate: Fechamentos/Nº de Clientes na fase do funil. Assim, saberemos um percentual aproximado, e validado ao longo do tempo, de quantos clientes de cada fase fecharão negócio. Em resumo, com esse tipo de projeção por funil de vendas, dá para aplicar o tal Hit Rate nos clientes que vivem cada fase hoje em seu negócio e estimar, com base na sua conversão típica, quantos serão negócios fechados no final deste período. Inclusive, é possível saber se a empresa terá problemas com fluxo de caixa no médio prazo.
Ferramentas Qualitativas
Mas, como já dito neste artigo, nem sempre teremos dados confiáveis, suficientes em volume e estáveis o bastante para lançarmos mão de uma projeção quantitativa. Quando este é o caso, outras técnicas são utilizadas para projetar vendas.
Empresas que conseguem coletar a opinião dos vendedores, sistematicamente, podem usar a opinião destes que são os olhos e ouvidos no campo. Empresas que tenham diretores ligados à operação comercial também podem contar com insights que o mercado dispõe a eles entre reuniões de sindicatos patronais, almoços da nata e rede de contatos. Há técnicas formais de coleta qualitativa que abordam desde Pesquisas de Mercado, que costumam envolver coleta in loco e geração de banco de dados, até construções de consensos entre especialistas.
Como é mais difícil garantir coleta suficiente, o interessante aqui é unir mais de uma forma de avaliação qualitativa, buscando cruzar para validação as verdadeiras razões e motivos das predições que têm essa origem mais humana e subjetiva.
Por fim, não há fim no exercício de projeção. Um analista que lança mão de técnicas quantitativas deve continuamente revisar seu modelo e, sempre que possível, é recomendável que revisite suas equações à luz dos novos dados e da dinâmica dos mercados. Esse esforço deve ser ao mesmo passo que mudam as dinâmicas do mercado, como diriam os clássicos, pari pasu, e, portanto, incessante.
O mesmo vale em dobro para as análises qualitativas que geram predições de vendas: é mudando que se mantém no mercado. O raciocínio talvez soe contra intuitivo, mas a dinâmica das forças que moldam a microeconomia e envolvem a empresa tornam insustentável uma fórmula vencedora, a priori, ser garantia no médio prazo. O mesmo vale para as projeções de vendas uma vez que são reflexos do que a empresa encontra de resultado.